Sousa/PB -
Normóticos

Classificando os desclassificados  - por: Alexandre Lyra*  

Já foi muito infeliz batizar um animal inteligente com o nome de burro porque ele empaca

Por Alexandre Lyra • Política

18/08/2025 às 19:21

Ads 970x250
Imagem Já foi muito infeliz batizar um animal inteligente com o nome de burro porque ele empaca

Já foi muito infeliz batizar um animal inteligente com o nome de burro porque ele empaca ‧ Foto: divulgação

Tamanho da Fonte

Contardo Calligaris, um psicanalista que escrevia para a folha de São Paulo, certa feita escreveu um artigo em sua coluna para comentar uma categoria de pessoa que ele identificou como portadora de uma tendência patológica pela normalidade: os normóticos. Achei interessante essa percepção de uma busca insana pela normalidade, impulsionada por uma pressão social para se adequar a padrões diversos. Daí, fiquei refletindo sobre como classificar as pessoas que se deixam levar pelo neofascismo. Pensei que não poderia desrespeitar certos animais tradicionalmente associados à falta da inteligência, há todo um projeto envolvido. 

Já foi muito infeliz batizar um animal inteligente com o nome de burro porque ele empaca. Ele empaca porque sabe o que quer. Outros também foram inadvertidamente usados como sinônimo para destempero, ou falta de iniciativa (o voo da galinha), eles não merecem isso, estão em seus limites. O ser humano, contudo, tem cérebro avantajado que proporcionou uma série de avanços sociais e tecnológicos, construiu máquinas, equipamentos e instrumentos diversos para melhorar o convívio social, por isso é estranho ver pessoas negando toda uma evolução, que elas mesmo desfrutam, para se agarrar a premissas mesquinhas, simplórias, egoístas e cínicas.

O caminho que encontrei foi a rejeição histórica e mundial ao projeto inicial que o inspirou, o fascismo. O fascismo foi uma experiência dura para a humanidade e depois de muita luta foi extirpado e condenado de forma unânime por todas correntes políticas (unindo capitalistas e comunistas  em sua eliminação), por todos Estados nacionais, todos povos. Foi para o lixo da história. Conclui que a melhor forma de classificar essas pessoas seria através do lixo, essa categoria que remete ao que é descartado pelo ser humano, ou porque não serve mais ou por estar estragado. Boa parte da nova extrema direita inicialmente não se assume neofascista, tem discurso conservador, apela para costumes e radicaliza no nacionalismo xenofóbico, na busca pelo resgate da proteção dos locais frente à invasão de imigrantes, mas outra parte é intolerante mesmo e só não se declara dessa maneira pela proibição de divulgação das teses fascistas na maior parte do mundo. Nas aparições públicas, contudo, mal disfarçam sua admiração com gestos e palavras. É o lixo que as inspira, que as governa.

Várias pessoas seguem essas doutrinas conscientemente, com o ódio no coração a lhes nortear, ainda que vários se achem os mais religiosos. O fantástico fez um programa tempos atrás para entender os haters pensando que ia ter dificuldade de atrair pessoas desse tipo para entrevista, mas a equipe foi surpreendida com retorno significativo de indivíduos querendo dar seu testemunho ( https://www.youtube.com/watch?v=pHzW9T3IJQY  ). Muitos, portanto, têm orgulho de ser ruim, pequeno, inferior, se manifestando agressivamente contra certos grupos sociais, no caso, em relação a pessoas tolerantes e de uma forma geral bem resolvidas, ou seja, trata-se de ressentimento. Outros têm ódio à inteligência e ao conhecimento adquirido, porque a maioria desses são bem-sucedidos por esforço e méritos, ou seja, são invejosos.

Enquanto a economia contemplava de um jeito ou de outro os menos competitivos (instruídos) e a sociedade aceitava chacota a religiões e direcionamentos sexuais/afetivos alternativos às convenções e costumes tradicionais, esse ódio era contido por uma suposta superioridade social e integração ao grupo maior, sendo expelido/abrandado em forma de humor, mas com a volta da selvageria do liberalismo radical combinado com o avanço das pautas afirmativas de grupos minoritários, a aceleração das inovações tecnológicas gerando desemprego e precarização das condições de trabalho, temos todos ingredientes para a tempestade perfeita, fazendo eclodir o esgoto humano até então drenado para outras áreas.

Com raras exceções, não há ser humano apenas mal ou bom, tudo é questão do que alimentar a alma. Trate bem e alimente corretamente as pessoas e, como regra, terás gente de respeito, descuide do ser e terás alguém ofensivo, conflituoso e egoísta. Sabe-se que dá trabalho cuidar do ser humano, sua formação é prolongada, e deixar ele livre no processo formativo é estragá-lo. Entregar ao mercado e à sociedade sem moldá-lo corretamente é deixar se desenvolver um instrumento para sua própria destruição. É preciso formar nossas crianças e adolescentes sem vacilar em torno dos valores adequados, principalmente o respeito ao outro, pois quem desrespeita tem que ser severamente punido. É sabido que muitas pessoas não descartam o lixo corretamente, mas o cúmulo é reaproveitar o que já foi mundialmente considerado um erro social inaceitável do homem, um lixo histórico. Um ser humano não faz isso, só um sub ser humano, que deve rever imediatamente suas referências ou ser enquadrado na lei para morar em locais onde não possam prejudicar ninguém; a prisão. 
 
* Professor titular do departamento de economia da Universidade federal da Paraíba 

Ads 728x90

QR Code

Para ler no celular, basta apontar a câmera

Comentários

Aviso Legal:Qualquer texto publicado na internet através do Repórter PB, não reflete a opinião deste site ou de seus autores e é de responsabilidade dos leitores que publicam.