26/05/2025 às 22:09
O podcast VideBula desta semana aborda uma síndrome genética rara, complexa e cheia de desafios — a Síndrome de Prader-Willi. Ela aparece na infância e exige um controle rígido da alimentação, porque o corpo não entende a saciedade e as pessoas estão sempre com fome.
E para entender melhor o que é essa síndrome entrevistamos com quem vive, trata e pesquisa Prader-Willi: o presidente da Associação Brasileira da Síndrome, Marco Aurélio Cardoso, que é pai de uma criança que convive com o diagnóstico, a endocrinologista pediátrica Ruth Rocha Franco e o pesquisador Robert Nicholls, que trabalha com Prader-Willi há mais de 30 anos nos Estados Unidos.
A síndrome de Prader-Willi é uma desordem genética, uma alteração no cromossomo 15, em que falta uma parte do cromossomo 15 que vem do pai. Esses genes carregam informações importantes, então, essa criança não recebe muitas informações para o seu desenvolvimento e, por causa disso, ela tem muitas alterações hormonais. Uma das características principais é o controle da fome, que também é feito pelo hipotálamo, então essas crianças não têm saciedade, são crianças que acabam desenvolvendo uma compulsão alimentar muito grande e uma obesidade muito grave.
Quanto ao desenvolvimento na infância, são crianças que nos primeiros dois anos de vida possuem baixo peso, têm dificuldade de ganhar peso, têm dificuldade de crescer, às vezes até dificuldade de se alimentar. Mas, depois de dois anos, o metabolismo diminui e elas começam a ganhar peso. A compulsão vai aparecendo com tempo, aproximadamente depois dos quatro anos, mas depois de oito anos fica bem grave. Já na adolescência é o pior momento porque eles vão além da compulsão, para as questões comportamentais. E depois na vida adulta eles continuam tendo essa fome e tudo isso, mas já em alguns casos fica um pouco mais controlado. No entanto, mesmo assim, eles ganham peso muito fácil porque o metabolismo é muito lento.
A endocrinologista pediátrica Ruth Rocha Franco destaca um dos sintomas característicos de uma pessoa com Prader-Willi:
“O que mais chama atenção, que quase 100% das crianças têm, é o que a gente chama de hipotonia. Uma criança que nasce muito molinha, parecendo uma boneca de pano, não chora muito, não se mexe muito, tem dificuldade de sucção, tem dificuldade de mamar.”
A médica alerta que toda criança que um dia teve hipotonia e que acabou desenvolvendo uma compulsão alimentar deve buscar o diagnóstico que pode ser feito, gratuitamente, pela Fiocruz.
E o Marco Aurélio Cardoso, que é pai de uma criança com a síndrome, recomenda que procure informações sobre a síndrome no site da Associação Brasileira da Síndrome de Prader-Willi, www.spwbrasil.org.br ou em qualquer outro site especializado.
"Uma vez você procurando o site especializado da associação, você pode ter certeza, você vai encontrar toda a verdade. Nada vai ser omitido. As dificuldades estarão lá, mas a esperança, a prova, a mostra de que sim é difícil, mas é super possível, também vai estar muito presente."
O VideBula vai ao ar todas as terças-feiras, no site da Radioagência Nacional e nas principais plataformas de áudio.
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Você pode conferir, no menu abaixo, a transcrição do episódio, a tradução em Libras e ouvir o podcast no Spotify, além de checar toda a equipe que fez esse conteúdo chegar até você.
VideBula - Episódio 8: Viver com Prader-Willi
🎵 ABERTURA: Sobe Som 🎵
Raíssa: Oi, pessoal! Bem-vindos a mais um VideBula, seu podcast preferido sobre saúde e direitos. Eu sou Raíssa Saraiva.
Pati: E eu sou Patrícia Serrão. O VideBula de hoje vai falar sobre uma síndrome genética rara, complexa e cheia de desafios — a Síndrome de Prader-Willi.
Raíssa: Ela aparece na infância e exige um controle rígido da alimentação, porque o corpo não entende a saciedade. as pessoas estão sempre com fome. Mas o impacto vai muito além do prato.
Pati: Pra entender melhor o que é essa síndrome, a gente conversou com quem vive, trata e pesquisa Prader-Willi: o presidente da Associação Brasileira da Síndrome, Marco Aurélio Cardoso, que é pai de uma criança que convive com o diagnóstico, a endocrinologista pediátrica Ruth Rocha Franco e o pesquisador Robert Nicholls, que trabalha com Prader-Willi há mais de 30 anos nos Estados Unidos.
🎵 SOBE SOM
Raíssa: A gente começa com a doutora Ruth, que explica de forma simples o que é a Prader-Willi e como ela afeta o corpo e o comportamento.
Ruth: Bom, a síndrome de Prader-Willi é uma desordem genética, é uma alteração no cromossomo 15, em que falta uma parte do cromossomo 15 que vem do pai.
Esses genes que a criança não recebe carregam informações importantes. Então, essa criança não recebe muitas informações para o seu desenvolvimento e, por causa disso, essas crianças têm muitas alterações, que vão desde alterações hormonais - elas têm um problema na formação do hipotálamo, que é a região que controla todos os hormônios. Além disso, uma das características principais é o controle da fome, que também é feito pelo hipotálamo, então essas crianças não têm saciedade, são crianças que acabam desenvolvendo uma compulsão alimentar muito grande, uma obesidade muito grave.
Pati: E essa compulsão não aparece logo de cara. Tem fases bem definidas.
🎵 SOBE SOM
Ruth: É uma coisa meio contraditória. São crianças que nos primeiros dois anos de vida, são baixo peso, têm dificuldade de ganhar peso, têm dificuldade de crescer, às vezes até dificuldade de se alimentar. Depois de dois anos, o metabolismo diminui e elas começam a ganhar peso, mas ainda não tem compulsão. A compulsão vai aparecendo com tempo assim, quatro anos aumentando, cinco, mas depois de oito fica bem grave. Lógico que isso varia de criança para criança. Na adolescência é o pior momento porque eles vão além da compulsão, as questões comportamentais e depois na vida adulta eles continuam tendo essa fome e tudo isso, mas já em alguns vai um pouco mais controlado mas mesmo assim eles ganham peso muito fácil porque o metabolismo também é muito lento.
Raíssa: Quais são os sintomas característicos de uma pessoa com Prader-Willi? O que posso perceber de diferente na evolução da criança para pensar neste diagnóstico?
Ruth: O que mais chama atenção, que quase 100% das crianças têm, é o que a gente chama de hipotonia. Uma criança que nasce muito molinha, parecendo uma boneca de pano, não chora muito, não se mexe muito, tem dificuldade de sucção, tem dificuldade de mamar.
Acho que o alerta é pensar na síndrome para toda a criança que um dia teve hipotonia e que acabou desenvolvendo uma compulsão alimentar ou interesse muito grande por comida. E também lembrar que 100% deles vai ter algum tipo de atraso no neurodesenvolvimento. Então são crianças que atrasam para falar, atrasam para andar.
Pati: Pediatras e endocrinologistas são alguns dos médicos que podem perceber a Prader-Willi, mas o acompanhamento clínico é multidisciplinar.
Ruth: A princípio, o diagnóstico, o resultado é genético, mas o clínico é o que faz pensar. Hoje existe, e isso que é importante falar, o diagnóstico hoje pode ser feito gratuitamente. Então, para quem não tem convênio, quem tem dificuldade, esse diagnóstico pode ser feito pela Fiocruz. O médico mandar, tem todo um protocolo para mandar o exame para lá, mas hoje dá para fazer gratuitamente esse resultado.
🎵 SOBE SOM
Raíssa: O diagnóstico precoce pode mudar tudo. Foi o que aconteceu com o filho do Marco Aurélio.
Marco: Com 20 dias de vida tinha o diagnóstico, com 7 dias de vida ele tinha suspeita. E isso faz e fez na vida dele uma diferença tremenda, porque por mais difícil que seja, não existe dia pior na vida de um pai do que receber um diagnóstico desse, mas por mais difícil que seja, por outro lado, é um dia abençoado porque você sabe o que você tem que enfrentar.
Pati: Os desafios de uma família que convive com a síndrome são diários. A vigilância é constante.
Marco: É você ter uma disciplina e um cuidado de 24 horas por dia para que o teu filho não tenha nenhuma escapada e com isso não saia da curva ideal do peso dele. Acho que esse é um dos principais pilares da síndrome.
E também essa parte mais soft, vamos dizer assim, que tem a ver com os comportamentos psicológicos e psiquiátricos, que muitas vezes precisam de intervenção e precisam de ajuda medicamentosa.
Raíssa: O maior problema é a hiperfagia — a vontade de comer o tempo todo.
Marco: MARCO: O Prader-Willi não tem essa saciedade. Ele vai comendo, vai comendo, vai comendo compulsivamente, e se não tiver controle, ele vira um obeso mórbido e tem a sua vida encurtada, infelizmente, por conta das complicações da obesidade mórbida.
Pati: E os medicamentos que fazem sucesso para obesidade em geral, como o Ozempic, por exemplo, não funcionam com quem tem Prader-Willi.
Ruth: Na verdade, a gente fica bastante limitado porque nenhum remédio funciona. Então o controle dessa questão alimentar tem que ser externo, tem que ser feito pelos cuidadores. Então em geral não deixar essas crianças expostas à comida, além disso também a quantidade tem que ser muito menor se eles têm um metabolismo mais baixo. Então assim, é muito difícil porque essas crianças, entre aspas, posso dizer que elas são viciadas em comida. Então, o cérebro fica pensando em comida 24 horas.
Raíssa: E isso exige medidas práticas na rotina diária.
Marco: Outro dia a gente viajou, acordo de manhã, vou até o quarto dele, já começo a ver os restos mortais de bolo, de sorvete, ele dormindo ainda e aquela confusão no quarto. Meu Deus! Corri lá na cozinha, lá embaixo, outro pote de sorvete, temos dois potes de sorvete mais ou menos pela metade no congelador, outro pote de sorvete vazio, a caixa de bolo de chocolate que ele assaltou, graças a Deus, só tinha uma fatia, porque se tivesse cheio, ele teria comido cheio. O pacote de sucrilhos virado na mesa, porque acho que ele desceu de madrugada, estava escuro, se assustou, não viu, sei lá o que é que aconteceu, que estava uma confusão, parece que passou um bicho ali.
Raíssa: Por essas e outras escapadas, a cozinha da casa do Marco é bem vigiada e fechada a chave.
Pati: Apesar de tudo isso, Marco reforça que é possível viver bem com a síndrome — desde que o diagnóstico chegue cedo e com a informação certa.
Marco: Não procure a síndrome no Dr. Google. Procure se informar sobre a síndrome no site da Associação Brasileira da Síndrome de Prader-Willi, www.spwbrasil.org.br ou em qualquer outro site especializado na síndrome.
Se você fizer um search no Google, a chance de vir só notícia ruim é muito grande. Uma vez você procurando o site especializado da associação, você pode ter certeza, você vai encontrar toda a verdade. Nada vai ser omitido. As dificuldades estarão lá, mas a esperança, a prova, a mostra de que sim é difícil, mas é super possível, também vai estar muito presente.
Raissa: Hoje a estimativa é que existam cerca de 6 mil pessoas com a síndrome no Brasil. Mas menos de mil foram diagnosticadas.
Marco: Então a gente, com isso, consegue concluir que para cada um diagnosticado, a gente tem cinco não diagnosticados. Por tudo que a gente falou, imagina o que significa na vida dessas pessoas não diagnosticadas. Então, por isso a importância da divulgação, se essa entrevista aqui resultar em um único novo paciente não identificado, já valeu super a pena.
🎵 SOM DE TRANSIÇÃO
Pati: A gente encerra esse episódio com o pesquisador Robert Nicholls. Ele trabalha com Prader-Willi desde a década de 80 e fala com entusiasmo sobre o futuro.
Robert: I think we will develop therapy for the behavioral problems and that will really change things particularly when the hyperphagia can be controlled.
So I think the last go change with the behavior and whether it'll be from genetic based therapies or whether we discovery of an existing drug that hasn't been tried in previously that will work. Future will tell.
It's just phenomenal to see how well they do. I just, I love seeing from parents and receiving the photos and how well the kids are doing.
Tradução - Rilton: Eu acredito que vamos desenvolver terapias para as alterações comportamentais e isso realmente vai mudar as coisas, principalmente quando a hiperfagia puder ser controlada. Então, acho que a última mudança será mesmo com o comportamento, seja com terapias genéticas ou pela descoberta de um medicamento existente, que ainda não testamos, mas que vai funcionar. O futuro dirá. E eu acho fenomenal acompanhar essas crianças, como elas estão indo. Eu simplesmente adoro ver os pais e receber as fotos de como as crianças estão se saindo.
🎵 SOM DE TRANSIÇÃO
Raissa: O VideBula é uma produção original da Radioagência Nacional, um serviço público de mídia da EBC, a Empresa Brasil de Comunicação.
Pati: Você pode ouvir outros podcasts e séries da Radioagência Nacional no nosso site, nos tocadores de áudio e com interpretação em Libras no Youtube.
Raissa: O podcast é idealizado e apresentado por Patrícia Serrão e Raíssa Saraiva, com edição de Bia Arcoverde. Na operação em Brasília, Lúcia Safatle, e no áudio e sonoplastia no Rio, Toni Godoy.
Pati: Neste episódio, tivemos a participação especial de Rilton Pimentel, que fez a tradução do pesquisador Robert Nicholls.
Raissa: Envie suas dúvidas e sugestões para o nosso e-mail, em [email protected].
Pati: E compartilhe esse e os nossos outros episódios para que a informação chegue a mais pessoas.
Raissa: Para mais informações, VideBula! Até a próxima!
🎵 SOM DE ENCERRAMENTO
Roteiro, entrevistas e apresentação | Patrícia Serrão e Raissa Saraiva |
Coordenação de processos e supervisão | Beatriz Arcoverde |
Identidade visual e design: | Caroline Ramos |
Interpretação em Libras: | Equipe EBC |
Implementação na Web: | Beatriz Arcoverde e Lincoln Araújo |
Tradução do pesquisador Robert Nicholls | Rilton Pimentel |
Operação de Áudio e sonoplastia no RJ | Toni Godoy |
Operação de Áudio em Brasília | Thiago Coelho |
Para ler no celular, basta apontar a câmera