11/09/2024 às 20:17
A Câmara Criminal do Ministério Público Federal (2CCR/ MPF) aprovou documento que orienta os integrantes da instituição a considerar o gênero da vítima em investigações e ações penais relacionadas à prática de violência política contra as mulheres. Embora os artigos do Código Eleitoral e do Código Penal que classificaram como crime essa conduta tragam a palavra “sexo”, segundo a Câmara do MPF, o termo deve considerar a proteção de todas as pessoas do gênero feminino, e não apenas o sexo biológico. A orientação também reforça ser atribuição do MP Eleitoral e do MPF apurar esses crimes e, quando couber, apresentar denúncia contra os agressores na Justiça.
A orientação emitida pela 2CCR serve de baliza para todos os procuradores da República e promotores eleitorais do país que atuam em matéria criminal. O documento foi aprovado pelo colegiado, em sessão realizada na segunda-feira (9), como resultado de pedido feito pelo Grupo de Trabalho (GT) de Prevenção e Combate à Violência Política de Gênero do MP Eleitoral. Na demanda, o GT ressaltou a necessidade de uma diretriz sobre o tema, uma vez que muitos promotores, procuradores e autoridades policiais ainda têm dúvidas sobre como aplicar os trechos recentemente incluídos nos Códigos Penal e Eleitoral, bem como sobre a competência para a persecução desses crimes.
Incluído no Código Eleitoral pela Lei 14.192/2021 (artigo 326-B), o crime de violência política de gênero envolve toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir ou restringir os direitos políticos de candidatas ou mulheres em exercício de mandato eletivo. A pena para os agressores varia de 1 a 4 anos de prisão. Como a competência para julgar esse crime é da Justiça Eleitoral, cabe aos integrantes do MP Eleitoral – procuradores do MPF e promotores de justiça na função eleitoral – conduzirem as apurações e apresentarem ações contra os agressores.
Já o artigo 359-P, incluído no Código Penal pela Lei nº 14.197/2021, é mais amplo e considera crime os atos de restringir, impedir ou dificultar, com emprego de violência física, sexual ou psicológica, o exercício de direitos políticos a qualquer pessoa em razão de seu sexo, raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. A pena para quem pratica esse crime varia de 3 a 6 anos de prisão. Para a Câmara Criminal, por se tratar de crime político, contra o Estado Democrático de Direito, a competência para o julgamento desses casos é da Justiça Federal, conforme previsto na própria Constituição brasileira. Portanto, cabe ao MPF atuar na persecução penal.
“A orientação permitirá uma atuação mais eficiente do MPF e do MP Eleitoral no combate aos crimes políticos e eleitorais, revelando avanço na proteção da participação política da mulher, na perspectiva de gênero”, declarou o subprocurador-geral da República e coordenador da Câmara Criminal do MPF, Francisco Sanseverino, ao votar pela aprovação do documento. Como a Justiça Eleitoral é um ramo especializado da Justiça Federal, o trabalho investigativo em ambos os casos – dos crimes tipificados pelos Códigos Penal e Eleitoral - deve ser conduzido pelo Ministério Público em conjunto com a Polícia Federal, sem prejuízo do apoio da Polícia Civil dos Estados.
Segundo a coordenadora do GT, Raquel Branquinho, o documento emitido pela 2CCR vai conferir mais agilidade na condução de apurações e processos relacionados à violência política de gênero. “O desconhecimento sobre a temática atrasa a atuação ministerial e de todo o aparato persecutório, causando o agravamento da situação das vítimas. A insegurança, idas e vindas para solucionar a atribuição, perda de elementos probatórios, principalmente os digitais, e outras consequências geram a falta de credibilidade quanto ao adequado funcionamento do sistema”, destacou, durante a sessão.
Direitos humanos – Ao adotar a interpretação das leis sob a ótica do gênero das vítimas, a orientação emitida pela Câmara Criminal atende ao Protocolo para Julgamento na Perspectiva de Gênero, adotado no âmbito do Poder Judiciário brasileiro pela Resolução 492/2023, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Os Tribunais Superiores no Brasil já fazem a análise das situações concretas sob as lentes do gênero, termo que se vincula a um conceito cultural muito mais abrangente e que permite a análise e identificação de vários fatores, alguns deles estruturais, que colocam a mulher numa posição de subalternidade, principalmente nos espaços públicos e políticos”, reforçou Raquel Branquinho.
Ao acatar a solicitação, Sanseverino, na condição de Relator, destacou que o Brasil é signatário de praticamente todas os tratados e convenções de defesa dos direitos humanos, com foco na pauta da não discriminação e em políticas de prevenção e repressão da violência contra a mulher. Segundo ele, a orientação é necessária para adequar a postura do Ministério Público às práticas consolidadas nas normas nacionais e internacionais que regem o sistema de direitos humanos quanto à garantia dos direitos femininos, "sem que haja a normalização da subalternidade institucionalizada pelo patriarcado e pelo machismo”.
Fonte: Ascom
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