Sousa/PB -
direito de criticar

O tempo que (não) nos espera  - por: Alexandre Lyra*

O exercício crítico é crucial para a evolução do ser humano, mas é algo muito difícil para a maioria das pessoas, pela simples razão de que não somos educados para criticar

Por Alexandre Lyra • Política

29/12/2025 às 19:49

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Imagem O tempo está passando, entra ano sai ano e os avanços são tímidos

O tempo está passando, entra ano sai ano e os avanços são tímidos ‧ Foto: reporterpb

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    Ao se aproximar o fim do ano, e o começo de um outro ano, um novo ciclo nos convida a fazer um balanço geral do que aconteceu e a traçar objetivos para o futuro próximo. Um balanço que não é só financeiro, aqui o conceito contábil é aplicado em todas dimensões da vida para ajudar a avaliar nossas opções profissionais, geográficas, pessoais, sociais e políticas. Se temos informações e conhecimentos, podemos rever o caminho traçado, mas há um elemento fundamental para assegurar que vamos tomar as decisões certas no sentido de continuar no rumo escolhido ou trilhar outras vias com perspectivas de avanço, que infelizmente é muito negligenciado pela maioria: a capacidade crítica.

            O exercício crítico é crucial para a evolução do ser humano, mas é algo muito difícil para a maioria das pessoas, pela simples razão de que não somos educados para criticar, fundamentados, a tudo e a nós mesmos. Criticar não é simplesmente falar dos outros, é analisar profundamente atitudes com bases apropriadas. As tradições são bem mais reforçadas em todo sistema educacional de qualquer sociedade, é natural que seja assim, a questão é se a sociedade está bem resolvida em suas várias dimensões. A tendência à conservação de um corpo social que atende e encaminha todas demandas sociais, políticas e econômicas dos cidadãos é bem razoável, mas não dá pra aceitar a perpetuação do estado das coisas numa sociedade que se repete em erros graves, excluindo a maioria do acesso a condições adequadas de vida socioeconômica.

            O tempo está passando, entra ano sai ano e os avanços são tímidos, o país marca passo em transformações estruturais mais significativas e isto fica evidente quando aparece uma China que muda significativamente em 30 anos. A China escolheu seu caminho, o nosso não precisa ser igual, mas tem que resolver problemas graves correspondentes a uma concepção de sociedade ultrapassada. O presente governo, por exemplo, faz um esforço para aprovar e divulgar medidas básicas, como a ‘isenção’ de uma camada maior de contribuintes do IR, que, em suma, é apenas uma atualização na tabela do imposto de renda, sem conseguir encaminhar medidas efetivamente transformadoras, como baixar os juros, estimular mais a tecnologia e o capital local que o estrangeiro, melhorar infraestrutura, aumentar o poder de defesa nacional (com mais equipamentos militares), aumentar a concorrência bancária, elevar a produção interna do petróleo refinado, etc.

O tempo passa e o desafio vai aumentando, tempo é dinheiro e a economia está perdendo de ganhar muita produção ao longo de anos e décadas. O século XXI exige mais investimentos tecnológicos, mas mais do que isso, exige um entendimento do que é ser cidadão contemporâneo e construir uma nação moderna nesse tempo. Não é suficiente apenas a assimilação tecnológica, é necessário o domínio das novas tecnologias, que continuam sendo geradas, produzidas e controladas por bigtecs estrangeiras, e um capital financeiro voltado para suas funções originais de financiar a produção de forma acessível ao invés de estimular rentismo com altas taxas de juros.

            Há pouco tempo tivemos no país a ascensão de todo um movimento de retrocesso social, com ameaças às instituições e a pessoas que tinham convicções sociais e políticas distintas, algo impensável poucos anos antes. As pessoas não tinham, e alguns continuam sem ter raciocínio crítico elementar para ver que faziam um movimento para piorar o que já está ruim. Neste ano de 2025 eles foram punidos. O tempo não volta atrás, e quando repete modelos equivocados, um certo pensador já dizia: é farsa. Infelizmente isso é compreensível pela formação das chamadas bolhas da internet, que se aliam a uma educação alienante, confirmando que o desafio está aumentando, pois agora, mais do que antes, as pessoas têm uma tendência a se fechar em seu mundo e não dar ouvidos a argumentos de outros grupos, por mais razoáveis que sejam.

            Desejo a todos um ótimo ano, mas sabendo que as transformações efetivas, pessoais ou sociais, não acontecem de um ano para o outro, precisam de maturação, e essa só vem com análise crítica, interna e externa. Vou desejar que todos possam se dedicar um pouco de seu precioso tempo à leitura de textos relevantes e livros científicos, particularmente de ciências sociais, de materiais diversos em sites sérios na internet, para que expandam seus horizontes políticos e sua compreensão do mundo e de nosso país dentro dele, para que possamos vislumbrar tempos melhores, pois precisamos avançar em muitos campos como sociedade e como economia. Com lacração não se chega à esquina.

            A música de Renato Russo já dizia que temos todo tempo do mundo. É bonito, mas não é bem assim. Essas palavras ressaltam a relatividade do tempo e o tempo de cada um, pois tudo tem seu devido tempo. Do ponto de vista da história da humanidade, devemos compreender que alguns países interferem na formação de outros para manterem a precariedade socioeconômica, produzindo atraso e condições para sua reprodução para ganharem com ele, e assim, a percepção de muitos do que é necessário para construir uma pátria fica precária, deficiente. Enfim, parafraseando Proust, é preciso recuperar o tempo perdido e encarar mudanças efetivas para almejar anos posteriores melhores.

 

* Professor titular do departamento de economia da Universidade federal da Paraíba.

 

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