
12/11/2025 às 19:03
“Estamos falando de uma porta aberta à fraude”. A advertência é da Oficiala do Registro de Imóveis de Mariana (MG), Ana Cristina Maia, ao analisar os riscos da tokenização imobiliária, prática que converte imóveis em representações digitais para circulação em plataformas privadas de blockchain.
Segundo ela, o modelo hoje defendido por empresas e pelo Conselho Federal de Corretores de Imóveis “não possui qualquer salvaguarda jurídica nem garante segurança às partes envolvidas”, pois ao contrário das vendas realizadas em cartório, onde há verificação de identidade, consentimento e capacidade civil, as transações por tokens “ocorrem por meio de login e senha e podem permitir a transferência de propriedade sem o preenchimento de requisitos legais e até mesmo sem conhecimento do verdadeiro dono”.
Prejuízos à prefeituras e credores
A registradora alerta ainda para o impacto financeiro e institucional da prática: “Quando o imóvel é tokenizado, a matrícula passa para o nome de uma empresa intermediária, e o bem deixa de ser rastreável pelo CPF ou CNPJ do proprietário”, afirma. Essa invisibilidade patrimonial, segundo ela, dificulta a recuperação de crédito e favorece a ocultação de bens, comprometendo não apenas credores privados, mas também o poder público na cobrança de tributos como o ITBI, IPTU e ITCD:
“Para o devedor pode parecer vantajoso, mas, na verdade, é um abalo na confiança do sistema registral e na própria segurança creditícia do país, podendo causar o aumento dos juros do financiamento das dividas e dificultar o acesso ao crédito”, resume.
Terreno fértil a fraudes
Segundo ela, o modelo atual de tokenização representa uma afronta direta à Lei dos Registros Públicos, que estabelece a exclusividade do Registro de Imóveis na constituição e publicidade de direitos reais. “A resolução do Cofeci recentemente suspensa pela justiça federal, extrapola as suas competências, pois ele tem poder de regular exclusivamente a profissão de corretor, não o sistema jurídico da propriedade imobiliária”.
Ela destaca que a alegada “agilidade” prometida compromete a segurança jurídica que só o registro público garante. Ao eliminar controles essenciais e criar um circuito paralelo de registro, a tokenização, na avaliação da registradora, inaugura um terreno fértil para a fraude, permitindo a ocultação de patrimônio e favorecendo organizações criminosas. As transações digitais, acrescenta Ana Cristina, também carecem de instrumentos de proteção contra fraudes pessoais e tecnológicas:
“Nada impede que alguém, de posse de login e senha, transfira tokens de um imóvel sem autorização do titular”, alerta. A ausência do sistema oficial da transmissão imobiliária sujeita ao controle juridico transforma a operação em um ato de risco sem transparência e as garantias da lei. “A blockchain pode registrar o ato, mas não atesta a verdade jurídica do negócio”, pontua.
Resolução suspensa pela Justiça Federal
A decisão, proferida pelo juiz Francisco Valle Brum, reconheceu que o órgão extrapolou suas atribuições ao criar normas sobre um modelo de registro paralelo ao oficial. O magistrado destacou que o Cofeci não pode “instituir regimes jurídicos inéditos” nem substituir a autoridade do sistema registral público, cujo aprimoramento, segundo o próprio juiz, está sob análise do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no âmbito do Sistema Eletrônico de Registros Públicos (SERP).
Fonte: Ascom
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