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Opinião

Prisão por descumprimento ao isolamento social do Covid-19?

Será que há fundamento legal em nosso ordenamento jurídico para a prisão da pessoa que descumprir o isolamento social?

Da Redação Repórter PB

21/05/2020 às 09:42

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Francisco Abrantes ‧ Foto: Repórter PB

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Há duas semana atrás, foi divulgado um fato interessante, qual seja, duas moças estavam caminhando na orla da praia quando foram literalmente "presas" com fundamento num suposto decreto do Poder Público. Na mesma ótica, um vendedor ambulante levou um inusitado golpe de judô, um famoso mata-leão dos guardas, por estar vendendo seu milho verde na beira da praia.

No Estado de São Paulo, o Governador João Dória afirmou, em entrevista ao SPTV, que, a partir da segunda quinzena de maio, se o número de pessoas circulando nas ruas aumentar, caberá ao Poder Público: advertir o cidadão ou, em última análise, decretar voz de prisão àquele que descumprir o isolamento social.

O governador do vizinho estado do Pernambuco decretou a possibilidade de apreensões de veículos e medidas coercitivas do poder público local, inclusive hipótese de privação de liberdade. Pois bem.

Será que há fundamento legal em nosso ordenamento jurídico para a prisão da pessoa que descumprir o isolamento social? Existe uma certa controvérsia a esse respeito. Por um lado, há uma corrente que defende sim a possibilidade de prisão com base no art. 268 do Código Penal: Art. 268 - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa: Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa.

Por outro lado, há uma outra parcela da doutrina que diverge dessa possibilidade de prisão do cidadão. Logo de início essa corrente traz perguntas importantes, quais sejam: Qual o alcance do conceito "determinação do poder público" contido no art. 268 do Código Penal?

Poderia então um decreto estadual ou municipal vir a ter o poder de impedir um direito fundamental de locomoção (direito de ir e vir)? Há quem defenda que um decreto administrativo estadual ou municipal não poderia impedir um dos direitos fundamentais mais preciosos de um Estado Democrático de Direitos como o direito de ir e vir do cidadão. 

Com efeito, independentemente da corrente adotada, não existe a menor dúvida de que todos os Entes Federativos tem o
dever de proteção à saúde (art. 23, II, CF). Chamado federalismo cooperativo. No entanto, parece ser mais razoável conferir à União a tarefa de viabilizar o comando normativo previsto no art. 268 do Código Penal, até mesmo para garantir a aplicação uniforme da legislação criminal em todo o território nacional.

Com o intuito de melhor esclarecer qualquer conflito, vale a pena ainda recordar que o STF concedeu liminar na ADPF 672 (Rel.
Min. Alexandre de Morais) dando autorização aos Estados e aos Municípios imporem algumas medidas de "restrições pontuais" para evitar aglomerações (ex.: suspensão das aulas escolares, suspensão da presença física nos cultos religiosos, fechamento de shoppings e etc.), mas não se lhes conferiu o poder de "proibir" e impedir o direito de locomoção das pessoas, acima de tudo sob pena de prisão.

O fato é que existe previsão no nosso ordenamento jurídico de crime para quem descumpre determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa. Assim, entende-se que esse assunto pode ir parar nos tribunais brasileiros, devendo ser alcançados até pelo STJ e STF, sendo certo que aquele que descumpre as medidas estipuladas pelo poder público sobre o Covid 19 pode vir a responder a processo criminal e até ser conduzido a Delegacia para a adoção dos procedimentos de praxe. É um assunto que tomará muito tempo do judiciário nos próximos tempos no âmbito penal.

Autor: Francisco de Assis F. Abrantes.
Advogado, graduado em Direito pela Universidade
Federal de Campina Grande- UFCG e Pós Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela UFCG.

Fonte: Repórter PB

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