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Minas Gerais

Um ano após tragédia da Vale, dor e luta por justiça unem famílias de 259 mortos e 11 desaparecidos

Há 365 dias, elas revivem diariamente essa data e se unem na dor pela perda inesperada e cruel de mães, pais, filhos, irmãos e companheiros.

Da Redação Repórter PB

25/01/2020 às 09:52

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Às 12h28 do dia 25 de janeiro de 2019, o destino e a história das famílias de 270 pessoas se cruzaram em Brumadinho (MG). Há 365 dias, elas revivem diariamente essa data e se unem na dor pela perda inesperada e cruel de mães, pais, filhos, irmãos e companheiros.

Ao longo de um ano, os parentes puderam se despedir de 259 vítimas da tragédia da Vale, que tiveram seus corpos – ou parte deles – localizados e identificados. Mas familiares de 11 desaparecidos ainda precisam lidar com uma espera sem prazo definido para ter fim.

Há 12 meses, essas famílias também se unem na busca por justiça. Nesta semana, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) denunciou o ex-presidente da Vale Fabio Schvartsman e mais 15 pessoas pelo crime de homicídio doloso, aquele em que há a intenção de matar. Eles também vão responder por crime ambiental, assim como a mineradora e a Tüv Süd.


“Não é possível que esse tanto de morte vai ficar em vão, e a nossa luta justamente é para não ficar”, diz Josiana Resende, que perdeu a irmã Juliana Resende e o cunhado Dennis Silva no desastre.

O casal deixou dois filhos gêmeos, na época, com dez meses. Passado um ano, Josiana e sua família ainda aguardam a localização e identificação do corpo da analista administrativo, que trabalhou por cerca de dez anos na Vale.

Em 12 meses, ninguém foi responsabilizado pela morte precoce de Juliana, do marido dela e das outras vítimas do desastre. Também não há ninguém preso. “Um ano e não tem ninguém na cadeia, isso dói também na gente”, desabafa Natália de Oliveira, irmã de Lecilda de Oliveira. Na lista dos 11 desaparecidos, o nome dela aparece logo abaixo do de Juliana.

Se, por um lado, não há detidos entre eventuais responsáveis pela tragédia, por outro, parentes das 270 vítimas se sentem até hoje encarcerados no dia do desastre.

“A gente está preso no dia 25, não tem como sair”, diz Alexandra Andrade, que perdeu o irmão Sandro Andrade.
Aos 42 anos, o operador de equipamento deixou três filhos. Ele foi identificado na primeira semana após a tragédia, quando também foi feito o reconhecimento primo dele, Marlon Rodrigues Gonçalves.

Para Alexandra, a espera pela localização dos corpos foi o pior momento deste último ano. “A pior dor é essa. Porque a gente não sabe se está vivo, como que está, se está sofrendo ou não. Depois começa a pensar que está morto. Então, a esperança vai diminuindo. Aí, com o passar dos dias, começa a pensar que não vai encontrar, o medo de não encontrar. Isso é uma semana, imagina quem já está há um ano”, diz.

Para ter forças superar essa espera pela localização de Lecilda, Natália começa os dias ouvindo áudios gravados pela irmã. Em um deles, registrado um mês antes de a barragem da mina do Córrego do Feijão vir abaixo, a funcionária da Vale consolava uma amiga pela perda da mãe.

“Saudade é uma coisa que dói, mas eu espero que você esteja bem”, dizia na mensagem de voz. Hoje, essas palavras consolam sua própria família.

Os 11 desaparecidos são chamados de joias pelos parentes e pelos bombeiros que seguem as buscas há um ano ininterruptamente. E Natália eternizou Lecilda justamente desta forma. No pescoço, carrega um colar com pingente de coração onde está gravada a foto da irmã. Ela conta que, desde o rompimento da barragem, foi a mais de 40 velórios. Nenhum deles de Lecilda.

“Esperar, esse verbo que nós estamos vivendo, é muito dolorido. (...) Então a gente está vivendo como se a gente tivesse doente. Doente de uma coisa que a gente está esperando uma cura que você não sabe se vai vir”, desabafa.
Unidas na busca por justiça, Natália, Alexandra e Josiana fazem parte da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos do Rompimento da Barragem Córrego do Feijão (Avabrum).

“Eu falo que Deus está carregando a gente no colo porque senão a gente não estava em pé há um ano fazendo esse trabalho, porque eu chamo de trabalho mesmo, porque é muito pesado”, afirma Josiana.

Reuniões, mobilizações e acompanhamento dos trabalhos do Corpo dos Bombeiros e da Polícia Civil se tornaram rotina na vida da irmã de Juliana.

“Viver o dia 25 todo dia. (...) Aí você respira fundo, e vai. E cria força para poder fazer as lutas que a gente precisa. E, às vezes, eu sinto, que eu preciso fazer essas lutas (...) Eu foco mais na questão de trazer um alento para os meus pais. Para mim, também. Mas ver eles sofrendo, corta o coração, dói na alma mesmo”, conta.

Natália afirma que, independentemente da localização do corpo da irmã, quer ter a sensação de ter feito tudo que poderia quando as buscas forem encerradas.

“Às vezes, as pessoas falam: ‘a luta é até quando? É até sempre’. Essa frase me apavora. Eu não quero ficar até sempre nessa luta”, diz.
Ela espera que haja punição, não só da mineradora. “Nós precisamos de moralizar o nosso país. A minha luta não é contra a Vale, a minha luta é contra o sistema”, diz.

Já Alexandra clama por justiça como forma de amenizar a dor das famílias. “Para que não seja impune e para que não aconteça mais. Porque [a tragédia de] Mariana, três anos antes, aconteceu. Dezenove mortos. Nenhum preso. E agora Brumadinho. Já tem um ano e, ainda, a gente espera que a justiça seja feita”, desabafa.

 

Com G1

Fonte: Repórter PB

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